segunda-feira, 29 de novembro de 2010

PENSAMENTO DE RENOSVALDO - por Kenny Rosa

            Às vezes vivemos a beira de tudo. Constantemente intentamos nalguma aventura. O coração recheado de expectativas, planos e planos de algo que almejamos. O anseio é tão grande que até no planejamento nos perdemos. Atropelamos etapas e pensamentos. Queremos, e isto nos parece o suficiente. Queremos... vamos... para ver no que vai dar. À beira da sorte, a beira do acaso.

            Acordei hoje e sentei à beira da cama rodeado de uma zonzeira. E quase, quase mesmo, não fui trabalhar. Estive à beira de dormir de novo. Ali, sentado.

Não podia, hoje seria um grande dia na minha vida profissional. Um projeto meu estava por ser aprovado pela empresa. Projeto à beira de aprovação é promoção também abeirando-se de mim. Oba! Já não era sem tempo, Renosvaldo.

            Esforço. Coragem. Pia. E sento-me sozinho como de costume à beira da mesa do café da manhã. Nossa... Quanta beira nos rodeia. Ah! Não se engane prezado leitor, só pelo fato de estar rodeado, não quer dizer que não esteja na beira. Arrisco-me a dizer que até mesmo o viver é abeirar-se da morte. Não! Não é hora de pessimismos.

            E assim foi o meu dia... Por pouco não bato o carro, não fico preso no engarrafamento ordinário, não me atraso para o serviço, não me atraso para a reunião. Por pouco cercar-me-ia de cuidados para levar tudo o que era preciso referente ao projeto. Por pouco ele foi aprovado. É! Fiquei à beira mais uma vez. Nem consegui almoçar direito. Sentado a beira da mesa de um bar, deito aqui estas lacrimosas linhas. À beira de um copo de cerveja. Então me dou conta de que só não estou à margem da solidão. Vejo-me mergulhado nela. Já é uma amiga fiel, nem posso reclamar.

Margem, mergulhado, palavras que me remetem o pensamento ao mar. Quantas vezes eu já me coloquei à beira dele? A sonhar, a planejar, a estar à beira de algo novo que talvez nunca viesse. E acho que nunca veio mesmo. Quantas vezes eu me safo à beira do abismo? Foram tantos os problemas e as desilusões. Tantas vezes rodeado de provações e tentações.

Agora ouço um chorinho no bar. Não o meu. O meu eu apenas sinto por dentro. Porque chamam de chorinho tão animado badalar de cordas? Acho que nunca vou entender isto. Talvez as notas estejam à beira da tristeza assim como eu.

Finda a cerveja já quente. Finta o chorinho. Finda também o texto. Finda por vez a desilusão de agora. Eis-me à beira de novo recomeço. Sou a fênix prestes a novo encher de pulmões. Aguardem meu novo projeto. Chega de ficar à beira da mesa, vou subir nela. Na vida. Mergulhar no mar da esperança novamente.

Bom... Agora estou de volta à cama, em preces e em sono. À beira de uma boa noite. Assim espero.

domingo, 28 de novembro de 2010

APENAS VIVER - por Kenny Rosa

Alguém um dia feito
Pôs o pé no conceito
E disse que deste jeito
Não funcionaria direito

Alguém um dia sem preparação
Comeu daquele pão
Que o diabo amassou no chão
E disse: assim não tem condição

Alguém um dia como você ou eu
Sob o preceito de ninguém se estabeleceu
Também sobre nada escreveu
E não disse como viveu

Apenas viveu

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

CRIANÇAS PRECOCES...AFFFF... - por Kenny Rosa

            Impressionante como estas crianças de hoje estão adiante no tempo com seus entendimentos.

            Diferente de outras crônica, mesmo gostando muito, não vou voltar os sentimentos do amigo leitor a um passado saudoso. Prefiro... Na verdade, preciso compartilhar uma experiência que me deixou bastante perplexo outro dia.

            Meu terceiro filho tem apenas três anos. Não me recordo da desenvoltura e coordenação motora quando eu tinha esta idade. Acho que eu estava aprendendo a andar nesta época.

            Está chegando o Natal. Momento em que a sensibilidade de qualquer criatura se extrema. Vemos corações se desdobrando para suprir as necessidades mais escusas e doridas do próximo.

            Foi neste clima que meu querido filhinho, ao fazer sua lista de possíveis presentes, pede, enquanto folheava um destes catálogos que tem de tudo, de alicate a soutien.

            - Eu quero uma mulher pelada.

            Espanto geral.

            - O quê? - Assustada, a mãe faz a temida consideração olhando para mim, claro.

            - Você precisa conversar com este menino!

            Bom! Não tinha outra opção. Fiz o que era necessário, dizendo que precisamos respeitar as pessoas e tal. Ele ouviu tudo atentamente.

            Foi o assunto da semana. A Marly, que trabalha na casa da minha sogra ao lado, adorou. Acho que nunca a vi rir tanto.

            A história não acaba por aqui. Uma tarde destas, estávamos todos na sala da minha sogra. Marly, que não podia perder a oportunidade, pergunta:

            - E aí? Já decidiu o que vai pedir ao Papai Noel?

            Foi quanto o precoce do meu filho respondeu prontamente sem altear os olhos do papel.

            - Uma mulher vestida.

            - Por quê? Não será mais pelada? - Ela corta o silêncio reticente do recinto.

            - Não. Papai falou que não pode.

            Que fique claro para o caro leitor que não foi bem isto que eu disse. Juro que me esforcei ao máximo. Pelo menos absorveu a idéia geral. Pensei.

            - Uai... E vai fazer o que com ela? - Continua Marly, não satisfeita.

            - Tirar a roupa dela. – Respondeu como quem diz o óbvio.

            Refleti novamente. Será que nem a idéia geral ficou? O certo é que para lidar com a educação destes pequenos, precisamos nos reeducar. Aprender. Porque ninguém pode oferecer o que não possui. Fica o riso, mas também a lição vinda da convivência com uma criança alegre de três anos.

            Minha maior preocupação agora. Será que nesta idade eu estava mesmo dando meus primeiros passos? Acho que estou começando agora na verdade.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

UM CACHORRO NOVO EM CASA - por Kenny Rosa

          
Um cachorro novo em casa. Sim, o outro morreu de leishmaniose. Ele é lindo, Pastor Canadense ou como dizem, Pastor Branco. Seu nome? Frodo! Apesar do verdadeiro herói daquele filme ser o Sam, a meu ver. Sam seria um bom nome para um cachorro guardião, companheiro. Talvez o próximo, pois este é Frodo.

            Dizem que é um cachorro inteligente. Uai... Pelo que me consta, a inteligência é característica do ser humano por mais que não pareça. De qualquer forma li a respeito e entendi que eles reagem pelo instinto animal. Sempre há um alfa. E para ficarem bem treinados precisava que eu fizesse este papel. Ai...Ai... Era o que me faltava. Ser um cão alfa.

            Bom... Tinha eu que, em corrente curta, conduzi-lo pelo quintal não deixando que ele fosse onde queria, mesmo se o lugar onde ele quisesse ir fosse o mesmo de minha intenção. O estranho é que ele sempre tentava ir para onde eu queria. Ele me antecipava. Não estava ajudando em nada.

            Será que ele era o alfa da minha casa? Não... Certamente não... Este lugar já tem dono. A minha esposa. Tenho certeza que ele não tasca. Pelo menos, assim espero, pois eu nunca consegui.

            O grande problema é que tem que haver disciplina para educá-lo e eu não tenho a mínima. Não consigo nem almoçar no mesmo horário todos os dias, imagina passear pelo quintal arrastando um cão que antecipa as minhas vontades. Não! Não vai dar certo. Sou livre. Gente... Sou livre. Um ser humano vivendo a mercê de um cachorro? Isto é inadmissível. Tenho minhas vontades e vou lutar por elas. Encho o peito de ar e de coragem para sentir a noite como nunca dantes. Ahhh... Que delícia é a liberdade!

            Junto com o peito, pulmão e nariz, eu abro à força os ouvidos e percebo uma voz alfa.

- Anda... Tá na hora. Vem por as crianças pra dormir e para de brincar com este cachorro.

Acho que o Frodo ficaria bem treinado pela minha esposa. Será que ele ficaria igual a mim? De repente poderíamos dividir as tarefas da casa.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O MINUTO DA PALAVRA – por Kenny Rosa

A poesia não passa do momento
É o minuto da palavra.
Belo, completo. Ali, agora.

Agora, já não mais existe.
A letra que não é escrita,
Jamais será dita novamente.
A memória é papel na chuva.

Já chove normalmente.
Não mais como naquele minuto.
Agora o sol brilha ordinariamente.
Nunca mais será diferente.

Outras poesias virão
E o poeta sorrirá em vão.
O instante fugir-lhe-á à mão.

O poeta é transporte da palavra.
Muitas vezes lhe falta o chão.
Noutras, estará ferido o coração.

Sempre num instante.
Naquele momento.
Já passou.

ADOLESCENTES – por José Cláudio (publicado no Recanto das Letras)

Diz o Rubem Alves que há apenas duas regras muito simples para se lidar com os filhos adolescentes. A primeira é: “não faça nada. Tudo o que você fizer estará errado.” A segunda: “fique por perto para catar os cacos, se for possível.” (está no livro E Aí? – Cartas aos Adolescentes e aos seus Pais).

O pai ia viajar com a filha de 12 anos e a sobrinha de 11. No dia anterior ela lhe disse:
- Ô pai, eu e a Bel já somos pré-adolescentes, vê se não vai com o rádio ligado naquelas rádios de velho, tá?
- ? (esta interrogação é o olhar dele para ela). Ele ouve as melhores rádios, na sua concepção, selecionadas a muito custo em meio às emissoras que tocam música o dia inteiro; não é tarefa fácil.
- É, pai aquelas músicas esquisitas, uma coisa de séculos atrás que você gosta de ouvir...
- É música de boa qualidade, filha, música suave, com letra e medodia para acalmar e sentir prazer. Mas eu posso colocar numa emissora que tanto eu como vocês vamos gostar.
- Ah, não, de jeito nenhum! Eu nunca vou gostar dessas músicas de velho! Você já ouvir Justim Bieber, Lady Gaga, Michel Mosso, Nx Zero, Restart...?
- Essa tal de Gagá eu ouvir dizer...
- Não é Gagá, pai, é Gagá, tá ligado? Ela é polêmica, mas é fantástica!
- Polêmica? Pois eu ouvi dizer, aliás, eu li sobre uma biografia dela, que o seu sucesso começou só porque ela começou a tirar a roupa e dançar nua em bares e boates para chamar a atenção, já que pela música em si não conseguia. Esta que será a polêmica? E esse tal de Justin Biba, não é aquele que parece o sargento Escovinha da revistinha Recruta Zero?
- Biba, não! Biba, não! Bieber é um menino mais lindo e talentoso que eu já vi. E saiba que ele é guerreiro, viu? Ele trabalha desde pequenininho para ajudar a mãe. Canta desde os quatro anos. E para de falar do cabelo dele que ele não é Emo.
- O que é emo, meu Deus?
Ah, pai, deixa pra lá, já vi que de “cultura” você não entende é nada, nadinha!

Conseguiram um acordo depois de muita cara feia da filha por causa das “ofensas” que ele proferiu contra as estrelas da hora. Foram ouvindo uma rádio “irada” até a metade do caminho e elas cantando alucinadas aquelas músicas incompreensíveis com o tom das vozes mais alto do que o do som do carro. Dali em diante, nem um quilômetro a mais, nem um a menos, ele mudou para a estação de sua preferência. Foi cumprido o trato. Em menos de cinco minutos olhou pelo retrovisor e viu que as duas já estavam dormindo uma no ombro da outra. Ficou conformado. Pelo menos sua música servia para ninar. Na sua concepção, na sua concepção! 


José Cláudio
Publicado no Recanto das Letras

domingo, 21 de novembro de 2010

O SOL ENTRE AS NUVENS - por Kenny Rosa

Está vendo aquele colchão cinza-azulado?
É lá que o sol dorme.
E nesta época do ano, com um pijama vermelho.
Em meio a lençóis lilases, fica sonolento.

Hoje vou fazer o mesmo.
Quero despertar amanhã do outro lado da cama.
Com a cara limpa, roupa alva.
O peito a arfar ares azuis-dourados.

Olhar com olhos sem mescla
A irradiar verbalizações claras.
Não deixar dúvidas, não deixar sombra.
Vou invadir a escuridão da ignorância e da tristeza.

Aquecer a minha volta, esquecer a revolta.
Vasculhar os recônditos do planeta interior.
Mas só amanhã, agora tenho sono.
A noite me envolve.
A escuridão me apaga.

Até amanhã!
Só até amanhã.

sábado, 20 de novembro de 2010

A PRIMEIRA CRÔNICA - por Roberta

     Hoje eu acordei mais uma vez!
     Graças a Deus estou sem dor e tenho ao meu lado alguém que amo. Meus filhos estão dormindo. O dia já começou e eu não quero levantar da cama.
     Como tenho um enorme e incômodo senso de responsabilidade, resisto ao frio e saio da cama. Penso no dia com preguiça, pois tenho aula o dia inteiro.
     Queria ficar em casa vendo o jogo da Argentina e Alemanha, um clássico do futebol mundial. Assisti todos os jogos da copa e vou perder o melhor.
     De novo meu senso de responsabilidade não me deixa faltar do curso.
     Tomei um café frio e parei em frente a TV. Um hábito matinal, ver as notícias do dia ou mergulhar a mente no vazio. O relógio não para e me levanto rapidamente do sofá em direção ao dia. Ele me espera ansiosamente e eu só queria continuar com a mente no vazio.
     Entro no carro, ligo o radio e mais uma vez minha mente viaja. Viajava pelo universo da mente, pela história da música, pelo passado, pelo futuro, pelos sonhos e de novo pelo vazio.
     Hoje o vazio está sendo meu melhor lugar!

     Chego cedo no curso, como sempre. Além de mim, uns "gatos pingados" pelo caminho com tanta preguiça quanto eu. Fui a um lugar com bastante sol e silêncio e pedi a Deus que alimentasse a minha alma com um pouco de paciência e força.
     Sou uma pessoa privilegiada. Penso, tenho discernimento, vejo e sinto. O que mais eu preciso?
     Talvez hoje, eu precise apenas quebrar a rotina, fazer algo diferente. Quebrar regras, burlar um pouco meu incômodo senso de responsabilidade.

     Entro na sala desarrumada e fria. Um aperto no peito que me torna prisioneira de mim mesma. Quero voar como o pássaro que está no galho da árvore lá fora. Se pudesse estaria em frente ao mar. Sentindo o cheiro de Deus.
     Quase ninguém veio a aula.
     O tempo também estrangula os outros. A prisão não é só minha.
     As falas e angustias são muitas, mas poucos estão dispostos e verdadeiramente entusiasmados.
     A sala está dividida entre os que tem bom senso e os que não tem senso algum. Com isto minha impaciência aumenta e o meu peito fica cada vez mais acorrentado.
     Dentro de mim há uma guerra consciencial. Minha responsabilidade versus a enorme vontade de ir embora. As espadas são afiadas e cruéis.
     Até que...
     Um sentimento me preenche. Inédito e revelador. As chaves da prisão estão em minhas mãos. Próximas e reais. As cores da vida estão em meus olhos.
     Se quero arco-íris eu preciso fazer chover.
     Vou embora. E sem guarda-chuvas...