quarta-feira, 24 de novembro de 2010

ADOLESCENTES – por José Cláudio (publicado no Recanto das Letras)

Diz o Rubem Alves que há apenas duas regras muito simples para se lidar com os filhos adolescentes. A primeira é: “não faça nada. Tudo o que você fizer estará errado.” A segunda: “fique por perto para catar os cacos, se for possível.” (está no livro E Aí? – Cartas aos Adolescentes e aos seus Pais).

O pai ia viajar com a filha de 12 anos e a sobrinha de 11. No dia anterior ela lhe disse:
- Ô pai, eu e a Bel já somos pré-adolescentes, vê se não vai com o rádio ligado naquelas rádios de velho, tá?
- ? (esta interrogação é o olhar dele para ela). Ele ouve as melhores rádios, na sua concepção, selecionadas a muito custo em meio às emissoras que tocam música o dia inteiro; não é tarefa fácil.
- É, pai aquelas músicas esquisitas, uma coisa de séculos atrás que você gosta de ouvir...
- É música de boa qualidade, filha, música suave, com letra e medodia para acalmar e sentir prazer. Mas eu posso colocar numa emissora que tanto eu como vocês vamos gostar.
- Ah, não, de jeito nenhum! Eu nunca vou gostar dessas músicas de velho! Você já ouvir Justim Bieber, Lady Gaga, Michel Mosso, Nx Zero, Restart...?
- Essa tal de Gagá eu ouvir dizer...
- Não é Gagá, pai, é Gagá, tá ligado? Ela é polêmica, mas é fantástica!
- Polêmica? Pois eu ouvi dizer, aliás, eu li sobre uma biografia dela, que o seu sucesso começou só porque ela começou a tirar a roupa e dançar nua em bares e boates para chamar a atenção, já que pela música em si não conseguia. Esta que será a polêmica? E esse tal de Justin Biba, não é aquele que parece o sargento Escovinha da revistinha Recruta Zero?
- Biba, não! Biba, não! Bieber é um menino mais lindo e talentoso que eu já vi. E saiba que ele é guerreiro, viu? Ele trabalha desde pequenininho para ajudar a mãe. Canta desde os quatro anos. E para de falar do cabelo dele que ele não é Emo.
- O que é emo, meu Deus?
Ah, pai, deixa pra lá, já vi que de “cultura” você não entende é nada, nadinha!

Conseguiram um acordo depois de muita cara feia da filha por causa das “ofensas” que ele proferiu contra as estrelas da hora. Foram ouvindo uma rádio “irada” até a metade do caminho e elas cantando alucinadas aquelas músicas incompreensíveis com o tom das vozes mais alto do que o do som do carro. Dali em diante, nem um quilômetro a mais, nem um a menos, ele mudou para a estação de sua preferência. Foi cumprido o trato. Em menos de cinco minutos olhou pelo retrovisor e viu que as duas já estavam dormindo uma no ombro da outra. Ficou conformado. Pelo menos sua música servia para ninar. Na sua concepção, na sua concepção! 


José Cláudio
Publicado no Recanto das Letras

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